Olá amigos da Câncer Direitos
Para explicarmos se o portador de câncer tem estabilidade no emprego com a profundidade que ele merece, primeiro, precisamos entender o que é a tal “estabilidade”.
Para os profissionais do direito a estabilidade no emprego é a limitação imposta ao empregador de rescindir de forma imotivada o contrato de trabalho. Simplificando, trata-se do direito do empegado de manter o seu emprego mesmo contra a vontade do empregador, exceto diante de causas previstas em lei.
Esta estabilidade no emprego é visualizada de duas formas:
1) estabilidade definitiva, a exemplo da antiga estabilidade decenal e dos servidores públicos celetistas e
2) estabilidade provisória, a exemplo da estabilidade sindical, da gestante e do acidentado.
Perceba que a estabilidade definitiva tem esse nome porque ela é absoluta, ou seja, alcançada a hipótese prevista na lei, adquirida estará a estabilidade, de forma permanente. Por outro lado, a estabilidade provisória tem como característica ser transitória, isto é, será mantida apenas e tão somente enquanto durarem os efeitos que a originaram.
Para você entender melhor, tem estabilidade definitiva o decenal que é aquele empregado com mais de 10 anos de serviço e que não tenha optado pelo sistema do FGTS. Ele não poderá ser despedido após alcançar os 10 anos de empresa, exceto se cometer falta grave. Note que não há prazo de duração da estabilidade, vigendo por todo o contrato após ter sido alcançada.
De modo diverso ocorre com a estabilidade provisória, pois ela tem prazo determinado. Assim encerrado o seu prazo legal, encerrada estará a estabilidade.
Interessante esmiuçarmos as hipóteses de estabilidade provisória, pois, ser portador de câncer não é uma exclusividade na vida dos pacientes que, por vezes, podem estar enquadrados em outras situações trabalhistas que também traduzam a garantia no emprego.
Conheça os exemplos de estabilidade provisória (temporária):
1. Estabilidade do Dirigente Sindical no emprego
É vedada a dispensa do empregado sindicalizado. A vigência da estabilidade se dará a partir do registro da candidatura ao cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ate 1 ano após o final do mandato, salvo faltas graves. Vale destacar que a estabilidade se estende, inclusive, aos eleitos suplentes. O empregado eleito representante do sindicato patronal não tem direito a estabilidade, pois a lei cuidou apenas dos representantes da classe dos empregados. A estabilidade somente envolve os membros titulares e suplentes da diretoria e do conselho fiscal (art. 522, caput, CLT).
2. Estabilidade de Membro da CIPA no emprego
A CIPA é a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e sua constituição é obrigatória, de acordo com as instruções expedidas pelo MTE, nos estabelecimentos ou locais de obras nelas especificadas. O objetivo da CIPA é a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador. Cada CIPA será composta de representantes de empresas e dos empregados. O número total de integrantes da CIPA varia em função do número de empregados no respectivo estabelecimento.
Os titulares da representação dos empregados nas CIPAs não poderão sofrer despedida arbitrária, entendendo-se como tal a que não se fundar em motivo: disciplinar, técnico, econômico ou financeiro. Ocorrendo a despedida, caberá ao empregador, em caso de ação trabalhista, comprovar a existência de qualquer dos motivos mencionados, sob pena de ser condenado a reintegrar o empregado. A garantia envolve não só o representante titular do empregado, como também o seu suplente.
3. Estabilidade da Gestante no emprego
A empregada gestante não poderá ser dispensada, salvo justa causa, desde a confirmação da gravidez até 5 meses após o parto, de modo que o desconhecimento da gravidez pelo empregador não afasta o direito ao recebimento da indenização, ainda que admitida mediante contrato por tempo determinado. Nos casos em que ocorrer o falecimento da genitora, a estabilidade será assegurada a quem detiver a guarda do seu filho.
4. Estabilidade do Acidentado no emprego
O empregado segurado, vítima de acidente do trabalho, tem garantida a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa durante o prazo mínimo de 12 meses, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente do fato de se ter solicitado ou percebido o referido auxílio-acidente. Ao se referir a acidente de trabalho, não deve ser somente considerado o típico, mas também as moléstias profissionais e do trabalho e os acidentes equiparados aos do trabalho.
Importante dizer que apesar do portador de câncer, muitas vezes, receber auxilio doença durante seu tratamento, o câncer não está abrangido por este conceito pois, como não se pode identificar a sua origem, ou seja, qual a causa da doença, também não se pode afirmar que decorreu do trabalho sendo uma doença profissional. Note que a lei refere-se ao beneficiário do auxílio doença acidentário (e não beneficiário do auxílio doença comum).
5. Estabilidade de Representante do Conselho Curador do FGTS no emprego
Aos membros do Conselho Curador do FGTS, enquanto representantes dos trabalhadores, efetivos e suplentes, é assegurada a estabilidade no emprego. A referida garantia concentra-se desde a sua nomeação até 1 ano após o término do mandato de representação, de modo que somente poderão ser demitidos por motivo de falta grave, regularmente comprovada por meio de processo judicial.
6. Estabilidade de Representante do Conselho Nacional da Previdência Social no emprego
Os membros, titulares e os suplentes, do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) terão direito à estabilidade no emprego, desde que representantes dos trabalhadores. Neste caso, a estabilidade vigorará desde a nomeação até 1 ano após o término do mandato de representação, somente podendo ser demitidos por motivo de falta grave, regularmente comprovada por intermédio de processo judicial.
7. Estabilidade de Empregados eleitos Diretores de Sociedades Cooperativas no emprego
Os empregados de empresas, que sejam eleitos diretores de sociedade cooperativa , gozarão da estabilidade. Vale destacar que neste caso específico a garantia não se estende aos suplentes.
8. Estabilidade de Membros de Comissão de Conciliação Prévia no emprego
Os titulares e suplentes que representem os empregados também possuem a estabilidade no emprego até 1 ano após o final do mandato, salvo se cometerem falta grave apurada em inquérito judicial. O início dessa estabilidade, valendo-se da analogia, inicia-se com o registro da candidatura, como ocorre para a CIPA e o sindicato.
9. Estabilidade de Portador de Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS) no emprego
A dispensa do trabalhador portador do vírus HIV pode ser considerada discriminatória em alguns casos.
Isto porque, segundo a Súmula 443 do TST, quando da despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito, tem-se a presunção de que se trata de uma dispensa discriminatória. Com a invalidação do ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.
O caso é semelhante ao que ocorre com os portadores de câncer. Entenda:
10. Estabilidade do Portador de Câncer / Neoplasia Maligna no emprego
Do mesmo modo como os portadores de AIDS, a dispensa dos paciente oncológicos ou dos ex-pacientes pode sim ser considerada discriminatória.
É assim porque o nosso ordenamento jurídico, através da Sumula 443 do TST, presume discriminatória a dispensa sofrida pelo portador de doença grave que cause estigma ou preconceito. Confira:
Súmula nº 443 do TST
DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO. Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.
Doenças que causam estigma são justamente as que evidenciam características físicas, morais ou étnicas que excluem a pessoa dos grupos da sociedade. Enquanto doenças que causam preconceito são as que atraem um juízo de valor absolutamente depreciativo a seu respeito ou de seu portador. Associando-se os conceitos acima com o cenário vivido pelos pacientes oncológicos, é possível se afirmar que o câncer enquadra-se como uma doença que causa estigma e preconceito.
Ponto relevante a ser destacado é que a dispensa presume-se discriminatória. Pode ter passado despercebido pelo leitor o fato de ser “presumida”, mas este é um atributo de extrema importância no decorrer da análise do caso.
Isso porque, a grande maioria dos pacientes deixam de ir atrás desse seu direito de manter-se em seu posto de trabalho porque imaginam que o simples fato de ter sido dispensado do trabalho não foi discriminatório se não houve chingamentos e humilhações por parte dos empregadores.
Os poucos que insistem na ideia de manter-se no trabalho, não veem como fazê-lo, pois cogitam que precisariam de provas de que houve a dita “discriminação”. Neste aspecto, essencial esclarecer que as Cortes Trabalhistas consideram ser dever do empregador provar que a dispensa se deu por motivo diverso do fato do empregado ser portador de doença estigmatizante. Assim, não caberá ao empregado a tarefa de buscar provas para demonstrar o alegado. O entendimento é coerente, pois como o empregado não tem acesso aos relatórios documentais da empresa para identificar a necessidade de demissão de algum funcionário, a única alternativa para ele provar o fato seriam os depoimentos dos colegas de trabalho, testemunhando sobre a demissão, o que, na maioria dos casos não ocorre por receio de represálias do empregador. Para não se esvaziar o direito à manutenção no emprego, os Tribunais tem repassado ao empregador o ônus de provar que a dispensa teve cunho técnico, econômico, disciplinar ou financeiro.
Diante da violação a esta garantia no emprego é possibilitado ao paciente discutir o caso judicialmente. No processo, se o empregador não conseguir comprovar que a dispensa não se deu pura e simplesmente pelo fato de ser portador de doença grave, deverá reintegrar o funcionário.
Outro ponto de destaque é a respeito da reintegração. Grande parte dos pacientes não adotam as medidas cabíveis para garantir este direito porque tem receios de retornar a uma empresa que já evidenciou seu desprezo. A boa notícia é que, se a reintegração não for possível, por ser desaconselhável, será possível a sua conversão em indenização.
Desse modo, ficou esclarecido que seja no momento inicial do recebimento do diagnostico, seja posteriormente, quando do retorno à atividade laboral, o portador de câncer não poderá sofrer dispensa discriminatória, havendo meios legítimos para evitar que tais condutas sejam normalizadas.
Estabilidade de portadores de câncer durante o afastamento do trabalho em gozo de auxilio por incapacidade temporária
A pergunta que resta é sobre a possibilidade da dispensa para os pacientes que estão em pleno tratamento, isto é, para os pacientes que estejam no gozo do auxílio por incapacidade temporária (antigo auxilio doença).
Neste aspecto, vale destacar que durante este período de recebimento de auxílio, o contrato de trabalho estará suspenso e em razão disso não poderá ser rescindido. Noutras palavras, o empregador não poderá encerrar o contrato dispensando o empregado que está afastado do trabalho. Nossos Tribunais Trabalhistas entendem que, se houver dispensa durante este período ela será nula, ou seja, sem efeito, salvo diante do cometimento de falta grave pelo funcionário. Também aqui é necessário aclarar que nem toda falta grave poderá ser levada em conta para a dispensa do empregado em gozo de benefício previdenciário, pois a falta grave ocorrida anteriormente ao período de afastamento não poderá ser apontada pelo empregador.
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